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arquitetura fabril

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Esta fábrica de Coca-Cola ficava no Ipiranga, na avenida Teresa Cristina esquina com rua Lima Barreto. Não sei quando foi construída, mas na foto ela parece ter uma atmosfera meio anos 50.

Também não sei quando foi demolida. Só sei que parte de sua fachada permaneceu em pé, convertida em muro.

A antiga fachada tem cumprido muito a bem sua nova função segregacionista: seja lá o que for que ela protege, da rua não dá nem pra saber do que se trata. E sua metamorfose sintetiza bem a evolução de São Paulo, que deixou de ser uma cidade de fábricas para virar uma cidade de muros.

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A foto da fábrica, cuja autoria desconheço, tem uma data anotada no verso: 1969. A foto do muro é reproduzida do Google.

Pode não parecer, mas o desenho é da esquina das ruas Lavapés e Scuvero, no Cambuci. Para não me deixar mentir, no fundo à esquerda está a igreja Nossa Senhora da Glória.

Essa construção gigantesca é a “Fabrica de Chapeos Dante Ramenzoni & Cia”. Fundada em 1894, ela funcionou neste lugar até encerrar as atividades, em meados da década de 1970. No processo de falência, o terreno de 18 mil metros quadrados acabou virando propriedade do governo do estado, que implodiu a fábrica em 1988 para construir uma subestação da Eletropaulo.

Hoje, o local está como na foto abaixo. Reparem como a igreja não mudou nadinha. E também vale a pena ler a matéria sobre a implosão da fábrica, no Jornal do Brasil de 25 de julho de 1988.

A primeira imagem é de um cartão publicitário da Ramenzoni, provavelmente dos anos 20. A foto atual é do Google, e a matéria do Jornal do Brasil é reproduzida do site da jornalista que a assina (linadealbuquerque.com).

A imagem acima é de um antigo slide de 35 mm, com a data de revelação impressa na moldura (outubro de 1960), mas sem nenhuma indicação de local. Mesmo assim, desde que a vi, eu cismei que era de São Paulo.

Para confirmar, fui pesquisar os jornais da época. Não foi difícil descobrir que a American Marietta SA de fato teve uma fábrica em São Paulo, inaugurada por volta de 1955. O endereço, citado em vários anúncios, era em Santo Amaro: rua Piratininga 84, esquina com o número 3504 da avenida João Dias.

Para ter certeza mesmo, fui atrás da imagem aérea de São Paulo em 1958, disponível na internet. E, de fato, pude ver que o que existia nessa esquina (local assinalado pela seta) era muito compatível com o slide. Dá para distinguir tanto o galpão da fábrica como a torre de concreto à sua direita. A partir daí, já não tive mais dúvidas…

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É claro que, de 1960 pra cá, muita coisa mudou na esquina em questão. A rua Piratininga mudou de nome, e hoje se chama Dr. Rubens Gomes Bueno. A avenida João Dias teve alterada a numeração, e o antigo 3504 corresponde ao atual 1800. A fábrica da American Marietta foi demolida, e seu lugar foi ocupado por outra indústria, muito mais poderosa. Hoje existe lá um templo da Igreja Universal do Reino de Deus.

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(O slide de 1960 é de autoria desconhecida; os dois anúncios são, respectivamente, da Folha da Manhã de 29 de novembro de 1959 e do Correio da Manhã de 4 de maio de 1955; a imagem aérea é do site geoportal.com.br; a imagem atual é do Google.)

Atualização em 29 de outubro: Descubro hoje mais duas fotos da fábrica. Não são a cores, como a primeira, e a intenção do fotógrafo parece ter sido mostrar os veículos da empresa, e não o local. De qualquer forma, achei as imagens interessantes e resolvi colocá-las aqui, como registro…

Em 1959, quando a foto foi tirada, a região do Ipiranga ainda era uma área fabril. Comprovamos isso à direita, onde dá pra ver a fumaça que alguma fábrica das redondezas soltava.

A fábrica deve ser hoje um galpão desocupado, dos muitos que existem por lá.

Ou quem sabe tenha virado um condomínio residencial, que também solta alguma fumaça por causa das churrasqueiras gourmet.

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A foto é um slide de 35mm, do mesmo turista que tirou a do post anterior.

O post de hoje surgiu de uma contribuição muito bacana do Felipe Reis, um leitor do blog.

O Felipe conta que um dia desses estava andando pela rua, quando reparou em um mendigo que mexia em um álbum de fotos antigas. Resolveu se aproximar, puxou conversa e ficou sabendo que o homem tinha acabado de achar o álbum no lixo. Acabou ganhando de presente algumas das fotos. São essas aí embaixo, todas do final dos anos 40.

Não foi preciso pesquisar muito para perceber que quatro das cinco fotos são do Tatuapé. Elas mostram a Duperial, uma antiga indústria química que, ao que consta, foi a primeira fábrica construída no bairro. Ela funcionou entre 1928 e 1978, na rua Azevedo Soares 656. Uma das fotos é de uma festa dos funcionários no interior da fábrica, e tem uma anotação no verso: é a despedida do Sr. Herculano, em janeiro de 1949.

A quinta foto, evidentemente, não é da Duperial. Ela mostra uma moça simpática posando na arquibancada do Pacaembu, pelo jeito aguardando o início do jogo. Não sabemos quem é ela, nem qual o seu vínculo com a fábrica ou com o tal Sr. Herculano. Essa parte da história não estava nas mãos do mendigo…

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No terreno da fábrica, hoje existe um condomínio de classe média alta, desses com várias torres, muro alto, forte vigilância e nome pretensiosíssimo: “Duccio di Buoninsegna”.

De acordo com uma pesquisa recente feita por Thaís Coutinho Milan Sartori, aluna do Instituto Mauá de Tecnologia, o terreno tinha um grande poço onde a empresa foi jogando lixo industrial e resíduos tóxicos ao longo dos seus muitos anos de funcionamento. O condomínio foi construído sem maiores precauções, e hoje as famílias do Duccio di Buoninsegna não sabem que moram em cima desse lixo. A foto atual é do Google Street View.

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Atualização em 7 de outubro de 2015:  Acrescento hoje mais algumas fotos, enviadas por outro leitor, o Emilio Lucchi.

O Emilio tem um importante vínculo com a fábrica: entre 1964 e 1978, o pai dele era funcionário da empresa e a família morava lá dentro. Nesta época o nome na entrada não era mais Duperial, mas ICI, e a fábrica propriamente dita já não funcionava: havia ali apenas um laboratório e um depósito de produtos para tinturaria.

A primeira foto é da rua Azevedo Soares, com a empresa à esquerda, e a segunda mostra o laboratório que ficava nos limites do terreno (sua lateral encostava no fundo das casas da rua Guatacaba).

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Mas as fotos mais interessantes, na minha opinião, são as coloridas. As duas primeiras mostram a casa onde o Emilio morou, que ficava dentro da fábrica mas, ao que parece, já estava lá antes dela: o Emilio desconfia que ela tenha pertencido à família Azevedo Soares, proprietária original da chácara onde a fábrica se instalou em 1928. E a terceira, tirada de dentro para fora, mostra as paineiras da vizinhança: elas ficavam no número 788 da Azevedo Soares, onde hoje existe (é claro) mais um condomínio…

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No email que enviou com as fotos, o Emílio comenta: “Hoje, como se sabe, nada mais resta aí, nem as casas, nem as gigantescas paineiras pra lá de cinquentenárias, nem o pomar, nem as demais espécies de árvores. Esse lugar era realmente muito bonito, hoje não é mais, ficou na lembrança. Mas quem sabe não apareça alguém do laboratório para contar mais histórias, ou alguém que saiba a origem dessa casa”.

Vamos torcer para que apareça. Enquanto isso, obrigado ao Emilio pela generosidade de compartilhar suas fotos e lembranças!

De todos os anúncios que eu já comentei aqui no blog, este talvez seja o mais interessante. Nele vemos as fábricas de tecidos Penteado e Santa Anna, “as maiores e mais importantes do Brasil, rivalisando com as principaes fabricas européas”. As duas pertenciam ao conde Antonio Álvares Penteado e produziam, respectivamente, tecidos de lã e de juta.

Mas o que torna o anúncio especial é a paisagem em volta das fábricas. Elas ficavam uma ao lado da outra na rua Flórida, no “suburbio do Braz”.

A rua está lá até hoje, mas não com esse nome. Foi rebatizada em 1979 para evitar confusões com sua homônima do Brooklin. Passou a chamar-se rua do Bucolismo, e o anúncio sugere que a escolha do nome não foi de todo descabida.

O anúncio saiu na Revista Moderna nº 26, de dezembro de 1898.

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Quando a cidade era mais gentil, a cerveja era produzida no Paraíso.

Hoje em dia pouca gente lembra, mas a fábrica ficava bem ao lado do metrô. Não sei exatamente quando ela foi construída, mas dizem que foi a primeira fábrica da Brahma no estado de São Paulo. Foi demolida por volta de 1994, depois de ficar alguns anos desativada.

A fábrica ocupava o quarteirão inteiro entre as ruas Apeninos, Vergueiro, Tupinambás e Paraíso, a poucas quadras da avenida Paulista. Não era bonita, mas era marcante na paisagem e funcionava como um marco visual. A catedral ortodoxa, bem ao lado, era simplesmente “aquela igreja que fica do lado da Brahma”.

As fotos mostram a fábrica em dois momentos. Na primeira ela aparece de frente, a partir da rua Vergueiro, nos anos 80. Na segunda ela é vista por trás, a partir da rua Apeninos, em 1958.

Hoje, no gigantesco terreno que era ocupado pela fábrica, existem dois condomínios de arquitetura anódina e nome empolado. Chamam-se “Up Side Condominium Club” e “Condominium Club East Side”. Obviamente ninguém sabe qual é um e qual é o outro.

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A primeira foto é reproduzida da internet (está disponível em saudadesampa.nafoto.net e em colunamiguelcostaprestes.blogspot.com, mas nenhum dos dois credita a fonte). A segunda foto é do arquivo da Folha.

A parte inferior direita da foto mostra uma área da cidade onde o ano de 2012 foi especialmente triste. Bem ali, onde o viaduto Engenheiro Orlando Murgel cruza a linha da CPTM, fica a favela do moinho, que passou o ano em evidência.

Na década de 70, quando a foto foi tirada, o que havia ao lado do viaduto ainda era o Moinho Central mesmo. A favela só chegaria uns 20 anos depois.

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Fico devendo o crédito da foto. Ela é minha (comprei há algum tempo por uma mixaria em um site de leilões), mas não sei de onde veio e desconheço o autor.

Houve um tempo em que o Cambuci era um bairro cheio de fábricas.

E houve um tempo, também, em que algumas fábricas eram assinadas pelos maiores nomes da arquitetura brasileira. Como esta, projetada por Rino Levi em 1942 para a Cia Jardim de Cafés Finos.

O prédio ficava na avenida do Estado, 5748. Nos últimos anos, ainda íntegro, vinha sendo usado como depósito da Ambev. Mas foi demolido há poucos meses, e em seu lugar está sendo construído um lamentável condomínio com 406 apartamentos de 30 metros quadrados cada um.

Mas o mais interessante é o nome do empreendimento: Innova Cambuci.

Algumas cidades, como Barcelona, conseguem requalificar seus antigos bairros industriais preservando a arquitetura. Já São Paulo prefere “innovar”. Com dois enes, o verbo fica mais sofisticado e significa jogar no lixo a melhor arquitetura da cidade.

(As duas primeiras imagens são do livro “Rino Levi: Arquitetura e Cidade”, de Renato Anelli, Abilio Guerra e Nelson Kon – editora Romano Guerra, 2001. A terceira é reproduzida da internet.)